TEMPOS DE SILÊNCIO

Voltar para casa depois de uma ida ao supermercado em tempos de coronavírus é quase uma ação de guerra. Abre o portão, deixa o sapato de fora, põe as compras em cima da mesa. Corre para tomar banho e por a roupa para lavar. Volta para limpar as compras. Lava item por item com água e sabão. Joga as sacolas no lixo, desinfeta a mesa. Guarda as compras. Limpa chave, limpa cartão, limpa tudo e lava as mãos.Ainda não sei dizer como estou lidando com isso, mas se me perguntasse hoje, no dia em que escrevo este texto, eu diria que é perturbador. Desde que anunciaram o primeiro caso no Brasil e logo depois aqui na cidade, eu tive momentos de desespero e conformismo. Hora acho que vamos todos morrer, hora acho que vai ficar tudo bem.

São tempos difíceis que vieram pra nos mostrar que o inferno não são só os outros, somos todos nós. Foi necessário aprender a controlar muitas coisas, sair da zona de conforto e ter mais paciência. A liberdade de ir e vir passou a valer mais. Percebemos (grande parte) o peso da responsabilidade de viver em comunidade. Sei que sair de casa pode custar não só a minha vida e da minha mãe, mas de muita gente. Eu voltei a rezar. Sei lá quanto tempo eu não rezava. É que eu tenho outras formas de lidar com a minha fé.

Não tem nem um mês que estamos nessa condição de isolamento e a gente já viu tanta coisa né? De pertinho a gente sentiu o peso da ignorância ao ver o líder do país falar em rede nacional que as pessoas deveriam voltar às ruas, se eximindo de qualquer responsabilidade. Que isolamento o quê! Isso é coisa da imprensa, da Folha, da Globo, do PT. Sobrou até pro Dr. Dráuzio Varela. 'Tem que trabalhar pra salvar a economia'. O presidemo abraçou eleitores, passeou na rua como se fosse um dia normal e se fez de preocupado. Ainda acho que alguém precisa avisá-lo que desemprego e fome no país não são novidades trazida pelo corona.

Por outro lado, a solidariedade. Coisa linda é o brasileiro solidário. Ajudam os idosos nas compras, ajudam doando alimentos, levando comida pra quem não tem. Ajudam na produção de máscaras, aventais, protetores. Ajudam com mão de obra e materiais. Ajudam como podem.

A gratidão eterna aos médicos, enfermeiros, auxiliares, fisioterapeutas e todo o corpo de profissionais que estão na linha de frente trabalhando como heróis em tempos de guerra. Sem esquecer dos que desempenham papeis importantes como motoristas, seguranças, entregadores. Se fossemos aplaudir ficaríamos o resto da vida e mais duas reencarnações.

Depois de 10 anos voltei a ficar muito ansiosa e chorei de medo. Sempre fui muito medrosa, mas depois de adulta tenho pouquíssimas lembranças de chorar por isso. Perdi a conta pra quantas pessoas eu perguntei se estavam com medo. No fundo acho que pergunto na expectativa que alguém me mostre que vai dar tudo certo. O problema é que de 10 pessoas, oito sentem medo e duas acreditam que o vírus vai passar longe, meio que nem aí. Tenho medo por mim e por todos. Não quero ser e nem ver ninguém virar estatística.

Percebo que as pessoas lá fora não entenderam a gravidade da situação. Desde que o presidente falou pro pessoal voltar à rotina -  afinal o corona é só uma gripezinha, um resfriadinho - o movimento de carros na rua da minha casa aumentou bastante. Isso me apavora porque a gente não pode contar com o senso das pessoas.

Eu sinto tanto por quem precisa trabalhar e sou muito grata a todas as pessoas que estão atuando em setores essenciais como da alimentação, farmácias, os entregadores e etc. Não consigo imaginar o temor que essas pessoas sentem ao sair e voltar para casa. Eu sei que para a maioria o isolamento não é uma opção. Sinto de verdade por todos que perdem de alguma forma e vão passar necessidade neste período, eu penso nisso todos os dias e me dói.  

Quanto mais as pessoas tiverem na rua, mais tempo levaremos para sair disso. E eu não digo isso do alto do meu privilégio porque eu não sei o que pode acontecer com a minha condição profissional. Ninguém sabe. A gente não sabe quando isso vai chegar ao fim.

São tempos de silêncio. Ás vezes a gente vê o noticiário com desesperança. 
É triste. Sobreviver ao caos é muito difícil. Dia desses eu li um tweet de alguém que dizia que viver a história era exaustivo. E é! Sejamos consciente e responsável. Lave bem as mãos, ajude o próximo e se puder, fique em casa.

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