NÃO SE INCOMODE COM A LUTA ALHEIA
Sempre que acontece algum crime, acidente ou algo que nos tira do lugar comum e alguém aparece tentando diminuir a sensibilização das pessoas, eu fico com vontade de apertar o sinal e descer do mundo.
É urgente! Precisamos para com essa mania de querer reduzir a importância dos fatos só porque aquilo não faz sentido pra gente ou porque, na nossa opinião, é desnecessário. Nem toda luta diz respeito a nós, mas todas existem por razões que merecem ser respeitadas.
Naturalmente, há situações que causam mais comoção que as outras, o que não é termômetro para medir a gravidade e importância. Estar sensibilizada com a morte cruel e precoce de uma mulher em questão não significa não se importar com todas as outras que se tornam parte de uma estatística cruel.
A mídia divulgou no ano passado uma pesquisa que mostra que aqui no Brasil são registrados 12 assassinatos e 135 estupros de mulheres, por dia. Doze mulheres mortas e 135 estupradas, em 24 horas. Se isso não te incomoda de alguma forma, talvez tenha algo errado por aí.
O assassinato da ativista Marielle Franco foi o caso que - infelizmente - deu notoriedade e evidenciou que a violência não escolhe cor, classe social, raça ou credo, e que atinge até mesmo quem luta(va) para a mudança dessa realidade. Ela, mulher, negra, vereadora socióloga, militante dos direitos humanos e feminista foi uma das 12 mulheres do dia.
Não a conhecia e tampouco sabia de sua trajetória até que a notícia me foi enfiada goela abaixo, sem opção. Soube pelo meu amigo Pedro Neto que logo que soube, tuitou: "A vereadora e socióloga Marielle Franco é assinada a tiros no Rio! PRESTEM A ATENÇÃO! S.O.S". Eu não sabia quem era a vítima da vez, mas prestar atenção nisso, como pediu Pedro, me apavorou.
O caso de Marielle não pode ser tratado como, apenas, mais um. Assim como os crimes que marcam de sangue os nomes de Marias, Joanas, Carlas e todas as que morrem diariamente no histórico violento de um país que parece não evoluir. Não dá para lidar de forma fria com essa dúzia trágica e nem com o fato de que uma mulher é assassinada a cada duas horas.
Aqui em Uberaba, desde o início de 2018, duas mulheres foram mortas de forma cruel pelos parceiros. A impressão que tenho é que está tudo fugindo do controle e cada vez mais perto, no estilo 'Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come'. Não tem graça e nem é uma disputa de qual crime ou morte é mais importante.
Não é sobre diminuir os outros casos. Estamos prestando atenção em tudo, e manifestando como dá. Cada um sabe quando onde o calo aperta. Há sim sensibilidade para toda ação violenta que é capaz de tirar a vida de outro alguém, independente de quem seja e como seja. Ninguém tem esse direito. Se estão matando quem luta pelos direitos de inúmeras pessoas, vai sobrar quem pra contar essa história?
*Texto escrito no dia 18 de março, quatro dias após o assassinato da vereadora Marielle Franco
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